terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Em jardins alemães




Já era o décimo quarto dia de viagem e eu tinha dois problemas: faltavam pernas e coluna para andar por Berlim e eu precisava tirar peso da mala, a Ryan Air só permitia 20 kg. Ou seja, minha ideia de deixar um livro na Alemanha e outro em Londres já era. Um havia ficado em Düsseldorf (mas esse eu só vou contar depois) e o outro ficaria ali em Berlim mesmo.

Decidi tirar um dia sabático, se é que isso existe. Meus pés não aguentavam mais cinco passos seguidos e minha lombar gritava de tanto carregar mochila. Larguei a máquina fotográfica em casa para aliviar o peso, peguei a canga, o iPhone, o livro que ia deixar, o livro que ia ler, coloquei na mochila (agora mais leve) e fui em direção ao Tiergarten. Antes, um pit stop no Starbucks para comprar água e uns lanchinhos.

Era oficialmente o primeiro livro que eu largava no exterior (o outro não contou muito) e não era um livro qualquer, tratava-se da autobiografia do Mandela, Long Walk to Freedom. Estava segurando minha ansiedade pra não largar ali, no primeiro pedaço de grama do jardim, ou no primeiro banquinho que eu passasse. Aguentei.

O Tiergarten é um jardim imenso, desses antigos jardins de castelos europeus. A gente anda, anda, anda e nunca acaba. E eu achando que ia descansar. Até que achei um cantinho sossegado pra estender minha canga e, no melhor estilo europeu, deitar pra ler meu livro, escutar música ou pensar na vida. Resultado, o cansaço era tanto que vinte minutos depois caí no sono. Acordei meia hora depois com aquele pensamento brasileiro: - Ai, meu Deus, será que todas as minhas coisas estão aqui? Não me roubaram? Mas, claro, estava tudo ali, inclusive o Mandela.

Li mais um pouco e resolvi procurar o lugar especial onde eu deixaria as palavras de Madiba. O mais incrível nesses jardins é que todo lugar parece especial. O laguinho onde você vê um casal de idosos de mãos dadas namorando no banquinho; o gramado onde um monte de crianças brincam; o cercadinho onde os donos deixam os cachorros correrem; as esculturas escondidas no meio das árvores; entre outros encantos que a gente só vê em filmes, mas está sempre tão distante da nossa realidade.

Foi então que passei numa alameda cheia de banquinhos. Alguns adolescentes conversavam em um, um ou dois casais namoravam em outros, um senhor lia em outro. Encontrei um banco mais distante e sentei. Coloquei o livro atrás de mim e disfarcei lendo mais duas ou três páginas do meu. Levantei com aquela mesma adrenalina e sensação de quem faz algo proibido que já relatei nas primeiras vezes e minha vontade era de sair correndo. Olhei para os lados e vi que ninguém tinha reparado nas minhas atividades clandestinas. Tive tempo, ao menos, de fazer um registro do crime e mostrar para vocês. E ali deixei Madiba.

Um dos lagos do jardim

Escultura em homenagem a música clássica

Casal namorando <3

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